O Legado Digital: O Que Acontece com Suas Contas Online Após a Morte?
Com a crescente digitalização da nossa vida, torna-se essencial compreender o destino das nossas contas online após o falecimento. Este artigo explora as implicações legais e as políticas adotadas pelas principais plataformas digitais, além de oferecer orientações sobre como garantir que seus desejos sejam respeitados. A imagem utilizada é cortesia de Ville Miettinen.
A cada dia que passa, armazenamos mais e mais informações no mundo digital. Refletir sobre o que acontece com essas contas quando partimos é fundamental. Este artigo detalha o que diz a lei e as políticas das grandes empresas, propondo maneiras de assegurar que sua vontade seja cumprida. Apesar de ser um tema delicado, pensar sobre o destino de nossos ativos digitais é crucial. Frequentemente, enquanto consideramos nossa própria mortalidade, o futuro de nossos bens online permanece negligenciado.
Esses bens possuem tanto valor sentimental (como e-mails, fotografias, documentos na nuvem, perfis em redes sociais) quanto financeiro. A sua conta Google, por exemplo, pode ser a chave para dados bancários e informações sobre sua carreira profissional.
Um caso recente, relatado pela TechnoBuffalo, expôs a dificuldade enfrentada por uma viúva ao tentar acessar a conta do falecido marido na Apple. A empresa inicialmente negou o acesso à senha, sendo necessário um apelo à mídia para que a Apple se desculpasse e oferecesse suporte. O objetivo da viúva era simplesmente continuar usando o iPad que compartilhavam. Apesar de a Apple estar seguindo sua política padrão, este episódio ressalta a necessidade de métodos mais eficientes para gerenciar as contas digitais de entes queridos após a morte, além de simplesmente compartilhar senhas.
Naturalmente, ninguém deseja que seus dados simplesmente desapareçam. A desativação de uma conta pode ser uma alternativa para evitar publicações indesejadas, como em um mural do Facebook.
No entanto, a legislação sobre heranças é ambígua em relação a bens digitais. Consequentemente, a menos que suas senhas tenham sido compartilhadas, seus familiares ou herdeiros podem ter dificuldades em herdar seus ativos online.
Este artigo analisa a legislação do Reino Unido, a interpretação das grandes empresas de tecnologia e oferece sugestões sobre como garantir que sua vontade seja respeitada.
O Destino da Sua Conta do Facebook Após a Morte
O Facebook aborda esta questão de forma séria e possui uma política no Reino Unido que permite ao executor de um testamento solicitar o encerramento de uma conta ou a sua transformação em um memorial. Embora o Facebook mantenha as informações, o acesso é restrito aos dados que já estavam disponíveis quando o titular da conta estava vivo. Nos EUA, o Facebook está testando um recurso que permite aos usuários definir o que acontecerá com a conta após a morte.
No Reino Unido, o Facebook oferece duas opções para contas de usuários falecidos: exclusão ou “memorialização”.
A “memorialização” remove dados sensíveis, como atualizações de status e informações de contato. As configurações de privacidade são ajustadas para que apenas amigos confirmados possam ver o perfil ou encontrá-lo na busca interna do Facebook.
O mural permanece disponível para que amigos e familiares possam deixar mensagens de lembrança, mas o login na conta é impossível. A exclusão ou a memorialização exigem prova de falecimento e podem ser solicitadas apenas por alguém com autoridade legal para representar o falecido.
Ainda que uma conta seja excluída, o Facebook armazena um arquivo com tudo o que foi publicado nela. Embora o titular da conta possa baixar esse arquivo, o Facebook não permite que familiares ou representantes legais acessem esse arquivo após a morte do usuário, alegando questões de privacidade.
Embora o Facebook permita que parentes confirmados solicitem a memorialização da conta, eles só poderão ver as informações que o falecido escolheu compartilhar. A empresa se recusa a disponibilizar mensagens privadas, mesmo após o falecimento, por considerar uma violação da privacidade. O Facebook não esclareceu se respeitaria os desejos de um testamento que contemplasse ativos digitais.
É evidente que o Facebook prioriza a privacidade dos seus usuários, inclusive após a morte. Em um caso notório, o Facebook negou aos pais de um adolescente que cometeu suicídio o acesso à conta do filho, apesar de uma ordem judicial.
No entanto, essa política pode mudar. Nos EUA, o Facebook permite que os usuários escolham quem controlará a conta após a morte, uma funcionalidade que será implementada em outras localidades. Após o falecimento, o “contato legado” poderá atualizar a foto do perfil, aceitar solicitações de amizade e publicar avisos na linha do tempo.
O Destino da Sua Conta do Twitter Após a Morte
Semelhante ao Facebook, o Twitter permite que um executor ou familiar desative a conta de um usuário falecido. No entanto, o Twitter não permite acesso à conta, e todas as informações são retidas.
Em casos de falecimento, o Twitter colabora com um representante legal ou familiar próximo para desativar a conta do falecido.
A política do Twitter para acesso à conta após a morte do titular é muito parecida com a do Facebook. O Twitter alega que os usuários são os donos de suas contas e, por motivos de privacidade, o acesso é negado a terceiros, independentemente do grau de parentesco. A empresa também não se manifestou quanto à possibilidade de honrar um testamento que delegue ativos digitais.
É importante notar que, ao contrário de outros serviços, grande parte das informações no Twitter é pública e acessível a qualquer pessoa.
O Destino da Sua Conta Google Após a Morte
A conta Google pode ser a mais relevante após a morte de um ente querido, mas também a mais complexa. O Google avalia cada caso individualmente, mantendo todos os dados. Não existe uma maneira fácil de desativar uma conta, e o Google sempre retém todas as informações.
O Google oferece inúmeros serviços, como Gmail, Picasa, Google Plus e Google Drive. As políticas parecem ser as mesmas para todos esses serviços, já que todos são acessados por meio de uma única conta.
É possível recuperar uma conta Google excluída, desde que a ação seja feita rapidamente.

Não existem regras definidas, e cada caso é analisado de acordo com suas particularidades. Isso pode abrir espaço para que uma pessoa autorizada tenha acesso aos ativos digitais de um titular de conta falecido.
O Google não forneceu esclarecimentos sobre como lidam com essas situações. Portanto, não é possível afirmar se todo o conteúdo online é considerado igualmente confidencial, ou se o Google pode permitir acesso a álbuns de fotos no Picasa, mas não a informações mais sensíveis, como as do Gmail.

Vale destacar que o Google oferece o “Gerenciador de Contas Inativas”, que permite que o titular da conta envie um e-mail para um contato de confiança, caso a conta fique inativa por um período pré-definido. Esse e-mail contém um link para baixar determinados tipos de conteúdo, conforme especificado pelo titular da conta.
Ativos Digitais de Valor Financeiro
A situação legal é mais clara quando se trata de ativos digitais com valor financeiro. Ian Bond, da Law Society, explica que ativos como contas bancárias online são tratados da mesma forma que os ativos tradicionais. Plataformas de varejo ou jogos de azar com créditos pendentes para o falecido são facilmente avaliados e gerenciados de acordo com a lei.
Pode-se pensar que o mesmo se aplica a bens adquiridos e armazenados online, como músicas e livros comprados no iTunes.

A Apple informou que, ao comprar uma música, você adquire uma licença para ouvi-la, não a posse da música em si. Essa licença não é transferível e, portanto, esses ativos digitais desaparecem com o proprietário. A Apple afirma que essa não é uma mudança de política em comparação com CDs ou LPs, mas sim uma aplicação mais rigorosa das condições da licença.
O mesmo se aplica a filmes, aplicativos, revistas e livros. A distribuição online apenas possibilita a aplicação dessas condições.
Gerenciando Seus Ativos Digitais
A expectativa de que seus ativos digitais estarão disponíveis para familiares ou herdeiros após sua morte pode ser frustrada, a menos que você tome precauções. Compartilhar suas senhas com familiares pode não ser a solução ideal, principalmente por questões de segurança. Além disso, senhas diferentes para cada conta e alterações regulares dificultam o acompanhamento.
Um gerenciador de senhas como KeePass ou 1Password pode ser útil, armazenando todas as senhas em um arquivo criptografado. Alternativamente, um documento do Word criptografado pode ser utilizado. Para garantir que as senhas sejam acessadas apenas após a morte, você pode fornecer a senha do gerenciador ao seu advogado com instruções para que ele a entregue a um beneficiário nomeado após o falecimento.

Lidar com o espólio de um falecido pode ser um processo demorado. Considerando que este será um período de sofrimento, o gerenciamento dos ativos digitais de um ente querido pode levar um tempo considerável. É crucial considerar por quanto tempo uma conta permanecerá ativa antes de ser excluída por inatividade. Embora essas informações devessem constar nos termos e condições de cada serviço, isso nem sempre acontece.
O Twitter informou que contas podem ser excluídas após seis meses de inatividade, enquanto o Facebook e o Google não divulgaram essas informações. Portanto, é aconselhável cuidar dos ativos digitais de entes queridos o mais rápido possível.
A Legislação

Para entender a situação legal, consultamos o advogado Ian Bond, da Higgs & Sons, que explicou que, de acordo com a lei na Inglaterra e no País de Gales, um representante legal tem o dever de coletar os bens do falecido e administrá-los conforme a lei. Isso inclui bens digitais, que devem ser protegidos e transferidos aos beneficiários.
Apesar da clareza inicial, a situação é mais complexa. “Os ativos digitais são armazenados em servidores compartilhados, e os provedores de serviços podem ter sede em outros países. Isso complica a definição de quais leis devem ser aplicadas.”
Por exemplo, se um usuário do Facebook falece em Londres, isso não garante que a lei inglesa se aplicará aos seus ativos digitais. “Na ausência de clareza sobre a legislação aplicável, os termos de uso dos provedores de serviços digitais é que definem o tratamento dos ativos após a morte do usuário. Cada provedor tem autonomia na decisão sobre o destino dos ativos digitais.”
Diante desse cenário, é fundamental conhecer as políticas das empresas que armazenam seus dados online.