Interfaces Cérebro-Computador (BCI): A Corrida Global por Domínio entre China e EUA

A tecnologia de Interface Cérebro-Computador (ICC) avança rapidamente, prometendo revolucionar o tratamento médico e, potencialmente, as capacidades humanas. Este campo em ascensão, outrora restrito à pesquisa científica, encontra-se agora na vanguarda de uma intensa competição global, com os Estados Unidos e a China disputando a liderança num mercado projetado para atingir US$ 12,4 bilhões até 2034, um aumento significativo em relação aos US$ 2,6 bilhões do ano passado, de acordo com a Precedence Research. A importância estratégica transcende o ganho econômico, representando uma arena crucial na contínua rivalidade tecnológica entre as duas nações.

  • O mercado de ICC deve crescer de US$ 2,6 bilhões no ano passado para US$ 12,4 bilhões até 2034, impulsionando a competição EUA-China.
  • Uma paciente de 67 anos com ELA em Pequim conseguiu formar caracteres chineses usando apenas o pensamento, através do chip sem fio Beinao-1.
  • Os EUA lançaram a “Brain Initiative” em 2013, com mais de US$ 3 bilhões em investimentos para projetos de neurociência.
  • A China, com atuação acelerada desde os anos 90, estabeleceu o CIBR em 2018, que impulsionou o desenvolvimento de tecnologias como o Beinao-1.
  • Empresas como Neuralink, Synchron e NeuCyber NeuroTech empregam abordagens distintas, com diferenças notáveis na invasividade dos procedimentos de implante.

Uma demonstração convincente do potencial transformador da ICC vem de Pequim, onde uma mulher de 67 anos com esclerose lateral amiotrófica (ELA), incapaz de falar, conseguiu formar caracteres chineses numa tela de computador usando apenas seus pensamentos. Este avanço, parte de um ensaio clínico envolvendo um chip sem fio chamado Beinao-1, ressalta o impacto profundo que a ICC pode ter na restauração da comunicação e autonomia para pacientes. Luo Minmin, diretor do Instituto Chinês de Pesquisa Cerebral (CIBR) e cientista-chefe do ensaio Beinao-1, enfatizou a demanda esmagadora por tal tecnologia, observando o profundo senso de recuperação de controle dos pacientes. Sua equipe planeja acelerar os ensaios em humanos, visando implantar chips em mais 50 a 100 pacientes no próximo ano, com aspirações de adoção clínica global se provada segura e eficaz.

A Corrida Global e Ambições Estratégicas

O desenvolvimento da tecnologia ICC está intrinsecamente ligado a objetivos estratégicos nacionais mais amplos. O líder chinês Xi Jinping tem consistentemente destacado a indústria de tecnologia como uma “vanguarda” e “principal campo de batalha” na competição global, refletindo a ambição da China de se tornar uma potência científica e econômica. Este impulso tem alimentado investimentos significativos em campos como a ICC, visando não apenas alcançar as nações ocidentais, mas também impulsionar a inovação. Nos Estados Unidos, a Administração Obama lançou sua “Brain Initiative” em 2013, investindo mais de US$ 3 bilhões para financiar projetos de tecnologia neurocientífica, sublinhando um compromisso de longo prazo com o campo.

Enquanto a pesquisa em ICC começou nos EUA na década de 1970, o engajamento da China, iniciado na década de 1990, acelerou-se rapidamente. Especialistas como Maximilian Riesenhuber, professor de neurociência na Universidade de Georgetown, reconhecem a capacidade demonstrada da China não apenas de alcançar, mas também de se tornar competitiva e até liderar em certas áreas. Esse progresso rápido é apoiado por financiamento governamental substancial e pelo estabelecimento de entidades como o CIBR em 2018, que mais tarde incubou a NeuCyber NeuroTech para comercializar produtos de tecnologia cerebral, como o Beinao-1.

Abordagens Divergentes e Nuances Tecnológicas

O cenário competitivo em ICC é caracterizado por diferentes abordagens tecnológicas. Em maio, o Beinao-1 havia implantado chips em cinco pacientes, um número comparável ao da Neuralink, de Elon Musk. Outra proeminente empresa dos EUA, a Synchron, apoiada por investidores como Jeff Bezos e Bill Gates, conduziu ensaios com 10 pacientes nos EUA e na Austrália, e foi a primeira a iniciar ensaios em humanos em julho de 2021. Enquanto isso, a UC Davis Health alcançou 97% de precisão na tradução de sinais cerebrais em fala para um paciente com ELA, estabelecendo uma alta referência para o campo.

Um diferencial chave reside na invasividade dos procedimentos de implante. Muitas empresas americanas, incluindo a Neuralink, frequentemente empregam métodos mais invasivos, colocando chips dentro da dura-máter (a camada protetora do tecido cerebral) para capturar sinais de maior fidelidade. Essa abordagem, embora potencialmente forneça dados melhores, envolve cirurgias mais arriscadas. Em contraste, o chip Beinao-1 da NeuCyber NeuroTech utiliza um método de implantação semi-invasivo, que os desenvolvedores descrevem como o “primeiro lote mundial” de tais implantes sem fio de ICC em humanos. Esta técnica é projetada para obter informações suficientes para decodificar palavras específicas mesmo através da dura-máter, potencialmente reduzindo os riscos cirúrgicos.

Luo Minmin destaca que comparações diretas entre sistemas como Beinao-1 e Neuralink podem ser como “comparar laranjas e maçãs”, dadas as suas diferenças de design. Beinao-1 e Neuralink variam na localização do implante, nos tipos de sinais cerebrais registrados e nos métodos de transmissão de dados. O chip chinês, por exemplo, registra de uma gama mais ampla de áreas cerebrais, embora com menor precisão para neurônios individuais. Isso sugere que, em vez de estarem em competição direta, essas diversas abordagens podem, em última análise, atender a diferentes necessidades de pacientes e aplicações terapêuticas. O desenvolvimento contínuo em ambos os países significa um entendimento compartilhado do imenso potencial da ICC e a contínua busca global por soluções que possam impactar profundamente a saúde e a interação humanas.