O mercado de ações britânico está a registar o seu desempenho semestral mais robusto desde 2021, um período marcado por significativos fluxos de capital estrangeiro. Paradoxalmente, esta recuperação foi acompanhada por vendas líquidas persistentes de investidores domésticos, criando um forte contraste com os padrões de investimento observados noutras grandes economias europeias. Esta divergência tem implicações significativas para a avaliação das empresas cotadas no Reino Unido e para a economia em geral, levantando questões sobre a alocação de capital e a saúde do mercado a longo prazo.
Dados recentes da EPFR e da Goldman Sachs revelam que o investimento estrangeiro em ações do Reino Unido atingiu um máximo de três anos, enquanto os investidores britânicos permaneceram vendedores líquidos ao longo do ano. Analistas da Goldman Sachs destacam isto como uma “grande diferença” em comparação com o resto da Europa. Esta tendência não é meramente uma questão de sentimento nacional; a análise da Goldman indica uma correlação direta entre uma maior propriedade de ações domésticas e avaliações de ações elevadas. Consequentemente, a observada falta de compradores britânicos é vista como um fator que contribui para o desconto de avaliação do FTSE 100 quando comparado com outros índices globais líderes. Este fosso de avaliação traduz-se num custo de capital mais elevado para as empresas cotadas em Londres, o que pode dificultar o crescimento e encorajar empresas, como a fintech Wise, a explorar listagens primárias noutros locais, como Nova Iorque.
Fatores Subjacentes que Impulsionam o Comportamento do Investidor Doméstico
Vários fatores sistémicos contribuem para este peculiar panorama de investimento. Os investidores institucionais, particularmente os fundos de pensões, têm vindo a reduzir sistematicamente a sua exposição a ações, com uma notável mudança das ações domésticas. Esta reafetação estratégica, exemplificada pelos planos da Scottish Widows de cortar ainda mais a sua alocação a ações do Reino Unido, faz parte de um padrão de décadas. Simultaneamente, a nível individual, os agregados familiares do Reino Unido exibem uma preferência pronunciada por manter dinheiro ou investir em propriedades em vez de participar no mercado de ações.
O governo está a abordar ativamente o lado institucional deste desafio. Iniciativas destinadas a consolidar regimes de pensões mais pequenos, a desbloquear excedentes em regimes de benefício definido e a melhorar a medição da relação custo-benefício oferecida pelos vários regimes são concebidas para canalizar mais capital para investimentos no Reino Unido. Embora estes esforços possam gerar apenas ganhos imediatos marginais, representam um esforço concertado para reorientar os fluxos de capital institucionais.
Fomentando uma Cultura de Investimento em Ações
Incentivar uma maior participação individual no mercado de ações apresenta um desafio mais complexo. Esforços regulatórios, como a revisão em curso da “fronteira de orientação de aconselhamento” da Autoridade de Conduta Financeira (FCA), são cruciais para tornar o aconselhamento e o apoio financeiro mais acessíveis ao público. Além disso, as reformas das contas de poupança individuais isentas de impostos (ISAs) podem desempenhar um papel fundamental. Os proponentes sugerem a criação de um produto ISA unificado que simplifique a transição entre dinheiro e investimentos, potencialmente facilitando a entrada de investidores iniciantes hesitantes no mercado, permitindo uma mudança gradual na alocação de ativos.
Em última análise, é necessária uma mudança cultural fundamental para complementar estas reformas políticas. Uma sondagem recente da YouGov destacou que quase um terço dos inquiridos percebe o investimento como algo semelhante a “jogo de azar”. Esta perceção persiste apesar de evidências financeiras convincentes a longo prazo: as poupanças em dinheiro são constantemente corroídas pela inflação, e o mercado imobiliário historicamente teve um desempenho inferior às ações. Se esta atitude prevalecente se mantiver, o Reino Unido corre o risco de comprometer a vitalidade e a competitividade futuras do seu mercado de capitais doméstico.